1. Os Estados democráticos e de tradição civilizacional ocidental adoptam com pompa e circunstância compêndios sobre a Justiça cujos princípios conferem a esta o estatuto de primeiro garante da consolidação dos valores fundamentais do Homem, com especial enfoque na dignidade da pessoa humana.
Na consecução destes valores, a concretização da aplicação da sanção aos prevaricadores deve espelhar e traduzir a medida da violação dos mesmos. A pena, “lato sensu”, tem um conteúdo de reprovação ética e como finalidades a prevenção geral – direccionada a toda a comunidade – a prevenção especial – com enfoque no próprio prevaricador, fazendo-o sentir a reprovação da comunidade e procurando evitar a sua reincidência e reassociá-lo – e a função reparadora dos danos causados à comunidade e aos lesados em concreto.
Ainda a propósito dos “castigos” a Hulk e Sapunaru aplicados pela justiça desportiva portuguesa, pela primeira vez deparamos com um artigo de opinião bem estruturado e concludente que, não apenas partindo do direito desportivo estrangeiro – cuja pesquisa comparativa é, pelo menos, alvo de grande modelo exemplificativo de decisões, conquanto só de propósitos enunciados – compara a pena final decidida a “uma notável reabilitação” dos prevaricadores agressores.
Este comentário, inserido no jornal record e pela pena de João Querido Manha, é um hino do sentimento do Homem comum perante a Justiça e traduz brilhantemente o mais elementar bom senso que, sendo a principal dose de que o julgador se deve servir perante a missão de fazer Justiça, tão arredio anda daquela função, em especial, mas não só, na justiça desportiva portuguesa.
João Querido Manha critica com fina ironia a justiça desportiva portuguesa, aconselhando “Guerrero” – jogador do Hamburgo que, muito recentemente, por ter atirado com uma garrafa de água à cara de um adepto foi desde logo castigado pelo seu clube e obrigado a pedir desculpa a toda a comunidade desportiva, através da televisão – a solicitar um qualquer parecer jurídico de um qualquer catedrático português para que este faça vingar a tese da “provocação acintosa e inaceitável pelo público agredido”.
Todavia, e João Querido Manha bem o acentua, a germano-jurisprudência desportiva não vai na esteira da luso-jurisprudência desportiva portuguesa para quem “levar provocação para casa não é filho de gente fina”.
E andou o CJ, como diz João Querido Manha, a “cirandar pela Europa”, acabando por exarar e consagrar aquilo que muitos comentadores desportivos portugueses fizeram com as suas cantatas despudoradas, exaltando os agressores como autênticos heróis, enquanto as vítimas acabaram por ser as vilãs da festa.
Gurreiro teve realmente azar de ter prevaricado na Alemanha, tal como já Cantona tivera em Inglaterra. Em Portugal teriam alguns estádios cheios de gente a cantar as suas façanhas, treinadores tipo professor Jesualdo prontos a reconhecerem-lhe os méritos das proezas, opinadores justiceiros com epopeias de feitos valorosos e ainda vigílias de desagravo à porta da justiça desportiva portuguesa a gritarem contra a “injustiça” de uma condenação e sanção dos agressores por tal feito.
2. Sob um título – ou subtítulo – totalmente desalinhado com o conteúdo fundamental da prosa versada em habitual e costumada verborreia, Miguel Sousa Tavares ocupa-se ainda deste assunto, naturalmente também para exaltar os “heróis” do túnel e azoinar o vilão, neste caso não as vítimas das “heróicas” brutalidades mas o que ousou sancionar aqueles.
É claro e natural que muita da sua prosa não tem qualquer interesse para qualquer leitor desapaixonado do reino futebolístico do ódio. A ela se pode aplicar, com toda a propriedade, o adjectivo por ele usado a (des)próprito de outro aspecto.
É uma prosa totalmente pífia.
Sem sequer nos impressionarmos com as suas usadas aldrabices factuais – diz, nomeadamente, que o CJ aniquilou toda a sentença da CD quando aquele aceitou tudo o que esta consagrou, naturalmente com excepção do que lhe inviabilizava a sua previamente querida desagravação da sanção – respingámos duas ideias que nos parecem pôr em destaque a sua incoerência de raciocínio, a menos que tenhamos de considerar tratar-se de uma pura e dura desonestidade intelectual.
Escreve Miguel Sousa Tavares – para quem ainda não saiba, este nosso comentador embirra com o facto de lhe retirarem Miguel do nome e acho que, com razão – que o caso Hulk não tem comparação com o caso Cantona.
A justificação, pasme-se, deve-se ao facto de este ter prevaricado perante um estádio cheio de gente e Hulk tê-lo feito nos esconsos corredores da Luz, à vista apenas de meia dúzia de pessoas.
Portanto, para Miguel Sousa Tavares não é o comportamento, com as suas circunstâncias e os seus resultados, o que conta.
Isto é, não é o comportamento prevaricador e os resultados o que conta, é a assistência que os presenciou.
Mas se nós escutarmos o senso comum, talvez seja natural que ele nos indica que quem escolhe lugares esguelhados é normalmente um covarde que quer praticar as suas “heróicas” acções pela calada.
Acrescenta ele algum arrazoado que as imagens de vídeo vigilância lhe inspiraram. Esquece que os jogadores foram expulsos pelo árbitro e que tais imagens não tiveram qualquer efeito, por impossibilidade legal – até ver – na sanção que lhe foi aplicada.
Miguel Sousa Tavares aproveita também para apelar à defesa de um tribunal desportivo com juízes impolutos e acima de toda a suspeita clubística.
É uma ideia bem interessante e que, penso, até todos os Benfiquistas a acolheriam de peito aberto. Só que ele devia começar por tentar convencer o presidente do seu clube a aceitá-lo e isso já parece tarefa bem difícil, se não mesmo impossível.
Mas a justificação é, de novo, engraçada. Escreve ele que tal tribunal devia julgar com base na equidade e na jurisprudência.
Eu creio que ele aplicou a palavra “equidade” com o sentido de “justiça” e a Justiça, que também é equidade nomeadamente como justiça retribuitiva, coloca em lugar de destaque os danos da vítima.
E Miguel de Sousa Tavares esqueceu-se completamente das vítimas e, em especial, daquela que teve de ser suturada com oito pontos na face.
Esqueceu-se, não é bem o caso. Sempre que dela se lembrou foi para a verberar como a má da fita porque teve a ousadia de “provocar”, muito embora seja relatado nos factos apurados e dados como provados que o chefe da segurança com maiores danos físicos até se encontrava e encontrou sempre numa posição de afastamento em relação aos incidentes que se iam desenrolando.
Apelar à jurisprudência – ao precedente do caso julgado anterior – é uma ideia boa. Só não se compreende que Miguel Sousa Tavares a defenda quando idolatra um acórdão do CJ que decidiu contra toda a jurisprudência anterior do mesmo órgão.
A maior justificação, porém, veio a final. Um tribunal desportivo assim constituído e a julgar de acordo com tais princípios viria substituir, diz, “regulamentos idiotas feitos por juristas incompetentes e aprovados em AG onde metade não sabe o que está a votar”.
Miguel Sousa Tavares apoda de “incompetentes” os juristas do seu clube e “idiotas” os regulamentos que o seu clube fez aprovar.
E concordo com ele. De facto, a suspensão preventiva de Hulk e Sapunaru deveu-se a estes juristas e todos sabem que os regulamentos em vigor se devem a juristas do seu clube, à cabeça dos quais está Guilherme Aguiar.
E concordo igualmente que metade – ou mesmo mais – não sabe o que está a votar. Mas isso é o que o presidente do seu clube quer, que eles, a troco de uns paliativos emprestados, se esqueçam da política do eucalipto que pratica e com a qual domina.
E foi por isso que o Benfica foi o único clube que não votou a emenda.
Miguel Sousa Tavares de vez em quando engana-se, inconscientemente, é certo, mas engana-se e nessa altura afirma verdades.
Ou seja, ele de vez em quando com a verdade se engana!
Na consecução destes valores, a concretização da aplicação da sanção aos prevaricadores deve espelhar e traduzir a medida da violação dos mesmos. A pena, “lato sensu”, tem um conteúdo de reprovação ética e como finalidades a prevenção geral – direccionada a toda a comunidade – a prevenção especial – com enfoque no próprio prevaricador, fazendo-o sentir a reprovação da comunidade e procurando evitar a sua reincidência e reassociá-lo – e a função reparadora dos danos causados à comunidade e aos lesados em concreto.
Ainda a propósito dos “castigos” a Hulk e Sapunaru aplicados pela justiça desportiva portuguesa, pela primeira vez deparamos com um artigo de opinião bem estruturado e concludente que, não apenas partindo do direito desportivo estrangeiro – cuja pesquisa comparativa é, pelo menos, alvo de grande modelo exemplificativo de decisões, conquanto só de propósitos enunciados – compara a pena final decidida a “uma notável reabilitação” dos prevaricadores agressores.
Este comentário, inserido no jornal record e pela pena de João Querido Manha, é um hino do sentimento do Homem comum perante a Justiça e traduz brilhantemente o mais elementar bom senso que, sendo a principal dose de que o julgador se deve servir perante a missão de fazer Justiça, tão arredio anda daquela função, em especial, mas não só, na justiça desportiva portuguesa.
João Querido Manha critica com fina ironia a justiça desportiva portuguesa, aconselhando “Guerrero” – jogador do Hamburgo que, muito recentemente, por ter atirado com uma garrafa de água à cara de um adepto foi desde logo castigado pelo seu clube e obrigado a pedir desculpa a toda a comunidade desportiva, através da televisão – a solicitar um qualquer parecer jurídico de um qualquer catedrático português para que este faça vingar a tese da “provocação acintosa e inaceitável pelo público agredido”.
Todavia, e João Querido Manha bem o acentua, a germano-jurisprudência desportiva não vai na esteira da luso-jurisprudência desportiva portuguesa para quem “levar provocação para casa não é filho de gente fina”.
E andou o CJ, como diz João Querido Manha, a “cirandar pela Europa”, acabando por exarar e consagrar aquilo que muitos comentadores desportivos portugueses fizeram com as suas cantatas despudoradas, exaltando os agressores como autênticos heróis, enquanto as vítimas acabaram por ser as vilãs da festa.
Gurreiro teve realmente azar de ter prevaricado na Alemanha, tal como já Cantona tivera em Inglaterra. Em Portugal teriam alguns estádios cheios de gente a cantar as suas façanhas, treinadores tipo professor Jesualdo prontos a reconhecerem-lhe os méritos das proezas, opinadores justiceiros com epopeias de feitos valorosos e ainda vigílias de desagravo à porta da justiça desportiva portuguesa a gritarem contra a “injustiça” de uma condenação e sanção dos agressores por tal feito.
2. Sob um título – ou subtítulo – totalmente desalinhado com o conteúdo fundamental da prosa versada em habitual e costumada verborreia, Miguel Sousa Tavares ocupa-se ainda deste assunto, naturalmente também para exaltar os “heróis” do túnel e azoinar o vilão, neste caso não as vítimas das “heróicas” brutalidades mas o que ousou sancionar aqueles.
É claro e natural que muita da sua prosa não tem qualquer interesse para qualquer leitor desapaixonado do reino futebolístico do ódio. A ela se pode aplicar, com toda a propriedade, o adjectivo por ele usado a (des)próprito de outro aspecto.
É uma prosa totalmente pífia.
Sem sequer nos impressionarmos com as suas usadas aldrabices factuais – diz, nomeadamente, que o CJ aniquilou toda a sentença da CD quando aquele aceitou tudo o que esta consagrou, naturalmente com excepção do que lhe inviabilizava a sua previamente querida desagravação da sanção – respingámos duas ideias que nos parecem pôr em destaque a sua incoerência de raciocínio, a menos que tenhamos de considerar tratar-se de uma pura e dura desonestidade intelectual.
Escreve Miguel Sousa Tavares – para quem ainda não saiba, este nosso comentador embirra com o facto de lhe retirarem Miguel do nome e acho que, com razão – que o caso Hulk não tem comparação com o caso Cantona.
A justificação, pasme-se, deve-se ao facto de este ter prevaricado perante um estádio cheio de gente e Hulk tê-lo feito nos esconsos corredores da Luz, à vista apenas de meia dúzia de pessoas.
Portanto, para Miguel Sousa Tavares não é o comportamento, com as suas circunstâncias e os seus resultados, o que conta.
Isto é, não é o comportamento prevaricador e os resultados o que conta, é a assistência que os presenciou.
Mas se nós escutarmos o senso comum, talvez seja natural que ele nos indica que quem escolhe lugares esguelhados é normalmente um covarde que quer praticar as suas “heróicas” acções pela calada.
Acrescenta ele algum arrazoado que as imagens de vídeo vigilância lhe inspiraram. Esquece que os jogadores foram expulsos pelo árbitro e que tais imagens não tiveram qualquer efeito, por impossibilidade legal – até ver – na sanção que lhe foi aplicada.
Miguel Sousa Tavares aproveita também para apelar à defesa de um tribunal desportivo com juízes impolutos e acima de toda a suspeita clubística.
É uma ideia bem interessante e que, penso, até todos os Benfiquistas a acolheriam de peito aberto. Só que ele devia começar por tentar convencer o presidente do seu clube a aceitá-lo e isso já parece tarefa bem difícil, se não mesmo impossível.
Mas a justificação é, de novo, engraçada. Escreve ele que tal tribunal devia julgar com base na equidade e na jurisprudência.
Eu creio que ele aplicou a palavra “equidade” com o sentido de “justiça” e a Justiça, que também é equidade nomeadamente como justiça retribuitiva, coloca em lugar de destaque os danos da vítima.
E Miguel de Sousa Tavares esqueceu-se completamente das vítimas e, em especial, daquela que teve de ser suturada com oito pontos na face.
Esqueceu-se, não é bem o caso. Sempre que dela se lembrou foi para a verberar como a má da fita porque teve a ousadia de “provocar”, muito embora seja relatado nos factos apurados e dados como provados que o chefe da segurança com maiores danos físicos até se encontrava e encontrou sempre numa posição de afastamento em relação aos incidentes que se iam desenrolando.
Apelar à jurisprudência – ao precedente do caso julgado anterior – é uma ideia boa. Só não se compreende que Miguel Sousa Tavares a defenda quando idolatra um acórdão do CJ que decidiu contra toda a jurisprudência anterior do mesmo órgão.
A maior justificação, porém, veio a final. Um tribunal desportivo assim constituído e a julgar de acordo com tais princípios viria substituir, diz, “regulamentos idiotas feitos por juristas incompetentes e aprovados em AG onde metade não sabe o que está a votar”.
Miguel Sousa Tavares apoda de “incompetentes” os juristas do seu clube e “idiotas” os regulamentos que o seu clube fez aprovar.
E concordo com ele. De facto, a suspensão preventiva de Hulk e Sapunaru deveu-se a estes juristas e todos sabem que os regulamentos em vigor se devem a juristas do seu clube, à cabeça dos quais está Guilherme Aguiar.
E concordo igualmente que metade – ou mesmo mais – não sabe o que está a votar. Mas isso é o que o presidente do seu clube quer, que eles, a troco de uns paliativos emprestados, se esqueçam da política do eucalipto que pratica e com a qual domina.
E foi por isso que o Benfica foi o único clube que não votou a emenda.
Miguel Sousa Tavares de vez em quando engana-se, inconscientemente, é certo, mas engana-se e nessa altura afirma verdades.
Ou seja, ele de vez em quando com a verdade se engana!
Caríssimo Gil, belo post, como aliás é habitual.
ResponderEliminarEsse MST deve ter engolido sapos quando entrevistou LFV há dias.
Abraço.
Belo post, na linha do que sempre acontece, tal como a espécie de crónica do Sousa Tavares também é na linha do que ele sempre faz. A do Manha está muito boa, desta vez.
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